sábado, 31 de dezembro de 2011

PARA QUE E A QUEM SERVEM OS ATUAIS ESTÁDIOS EM CONSTRUÇÃO?

Romário:
QUE PAÍS É ESSE?
Muito bom!
Parte de entrevista do ROMÁRIO ao jornalista Cosme Rimoli - TV Record ..
- Você foi recebido com preconceito em Brasília?
Olha, vou ser claro para quem ler entender como as coisas são. Há o burro, aquele que não entende o que acontece ao redor. E há o ignorante, que não teve tempo de aprender. Não houve preconceito comigo porque não sou nem uma coisa nem outra. Mesmo tendo a rotina de um grande jogador que fui, nunca deixei de me informar, estudar. Vim de uma família muito humilde. Nasci na favela. Meu pai, que está no céu, e minha mãe ralaram para me dar além de comida, educação. Consciência das coisas... Não só joguei futebol. Frequentei dois anos de faculdade de Educação Física. E dois de moda. Sim, moda. Sempre gostei de roupa, de me vestir bem. Queria entender como as roupas eram feitas. Mas isso é o de menos. O que importa é que esta sede de conhecimento me deu preparo para ser uma pessoa consciente... Preparada para a vida. E insisto em uma tese em Brasília, com os outros deputados. O Brasil só vai deixar de ser um país tão atrasado quando a educação for valorizada. O professor é uma das classes que menos ganha e é a mais importante. O Brasil cria gerações de pessoas ignorantes porque não valoriza a Educação. E seus professores. Não há interesse de que a população brasileira deixe de ser ignorante. Há quem se beneficie disso. As pessoas que comandam o País precisam passar a enxergar isso. A Saúde é importante? Lógico que é. Mas a Educação de um povo é muito mais.
- Essa ignorância ajuda a corrupção? Por exemplo, que legado deixou o Pan do Rio?
Você não tenha dúvidas que a ignorância é parceira da corrupção. Os gastos previstos para o Pan do Rio eram de, no máximo, R$ 400 milhões. Foram gastos R$ 3,5 bilhões. Vou dar um testemunho que nunca dei. Comprei alguns apartamentos na Vila Panamericana do Rio como investimento. A melhor coisa que fiz foi vender esses apartamentos rapidamente. Sabe por quê? A Vila do Pan foi construída em cima de um pântano.. Está afundando. O Velódromo caríssimo está abandonado. Assim como o Complexo Aquático Maria Lenk... É um escândalo! Uma vergonha! Todos fingem não enxergar. Alguém ganhou muito dinheiro com o Panamericano do Rio. A ignorância da população é que deixa essa gente safada sossegada. Sabe que ninguém vai cobrar nada das autoridades. A população não sabe da força que tem. Por isso que defendo os professores. Não temos base cultural nem para entender o que acontece ao nosso lado. E muito menos para perceber a força que temos. Para que gente poderosa vai querer a população consciente? O Pan do Rio custou quatro vezes mais do que este do México. Não deixou legado algum e ninguém abre a boca para reclamar.
- Se o Pan foi assim, a Copa do Mundo no Brasil será uma festa para os corruptos...
Vou te dar um dado assustador. A presidente Dilma havia afirmado quando assumiu que a Copa custaria R$ 42 bilhões. Já está em R$ 72 bilhões. E ninguém sabe onde os gastos vão parar. Ningúem. Com exceção de São Paulo, Rio, Minas, Rio Grande do Sul e olhe lá...Pernambuco... Todas as outras sete arenas não terão o uso constante. E não havia nem a necessidade de serem construídas. Eu vi onze das doze... Estive em onze sedes da Copa e posso afirmar sem medo. Tem muita coisa errada. E de propósito para beneficiar poucas pessoas. Por que o Brasil teve de fazer 12 sedes e não oito como sempre acontecia nos outros países? Basta pensar. Quem se beneficia com tantas arenas construídas que servirão apenas para três jogos da Copa? É revoltante. Não há a mínima coerência na organização da Copa no Brasil.
- São Paulo acaba de ser confirmado como a sede da abertura da Copa. Você concorda?
Como posso concordar? Colocaram lá três tijolinhos em Itaquera e pronto. E a sede da abertura é lá. Quem pode garantir que o estádio ficará pronto a tempo? Não é por ser São Paulo, mas eu não concordaria com essa situação em lugar nenhum do País. Quando as pessoas poderosas querem é assim que funcionam as coisas no Brasil. No Maracanã também vão gastar uma fortuna, mais de um bilhão. E ninguém tem certeza dos gastos. Nem terá. Prometem, falam, garantem mas não há transparência. Minha luta é para que as obras não fiquem atrasadas de propósito. E depois aceleradas com gastos que ninguém controla.
- O que você acha de um estádio de mais de R$ 1 bilhão construído com recursos públicos. E entregue para um clube particular.
Você está falando do estádio do Corinthians, não é? Não vou concordar nunca. Os incentivos públicos para um estádio particular são imorais. Seja de que clube for.. De que cidade for. Não há meio de uma população consciente aceitar. Não deveria haver conversa de politico que convencesse a todos a aceitar. Por isso repito que falta compreensão à população do que está acontecendo no Brasil para a Copa.
- A Fifa vai fazer o que quer com o Brasil?
Infelizmente, tudo indica que sim. Vai lucrar de R$ 3 a R$ 4 bilhões e não vai colocar um tostão no Brasil. É revoltante. Deveria dar apenas 10% para ajudar na Educação. Iria fazer um bem absurdo ao Brasil. Mas cadê coragem de cobrar alguma coisa da Fifa. Ela vai colocar o preço mais baixo dos ingressos da Copa a R$ 240,00.. Só porque estamos brigando pela manutenção da meia entrada. É uma palhaçada! As classes C, D e E não vão ver a Copa no estádio.
O Mundial é para a elite. Não é para o brasileiro comum assistir.
- Ricardo Teixeira tem condições de comandar o processo do Mundial de 2014?
Não tem de saúde. Eu falei há mais de quatro meses que ele não suportaria a pressão. Ser presidente da CBF e do Comitê Organizador Local é demais para qualquer um. Ainda mais com a idade que ele tem. Não deu outra. Caiu no hospital. E ainda diz que vai levar esse processo até o final. Eu acho um absurdo.
- Muito além da saúde de Ricardo Teixeira. Você acha que pelas várias denúncias, investigações da Polícia Federal... Ele tem condições morais de comandar a organização Copa no Brasil?
Não. O Ricardo Teixeira não tem condições morais de organizar a Copa. Não até provar que é inocente. Que não tem cabimento nenhuma das denúncias. Até lá, não tem condições morais de estar no comando de todo o processo. Muito menos do futebol brasileiro...
Entrevista concedida ao repórter Cosme Rímoli, da TV Record.
A África apresentou há alguns meses atrás o resultado final da Copa do Mundo: deu prejuízo e grande. Agora é a vez do Brasil. Fifa, CBF, políticos e os empreiteiros vão ganhar muito dinheiro. E o povo? Nada como sempre!
Apenas terá a obrigação de contribuir para pagar a conta.
Precisamos virar a cara para esses eventos literalmente sujos e mafiosos.
Quem teve a idéia de promover, o evento em nosso país, alguém sabe?
O Brasil é uma farsa, como sempre irá jogar a sujeira para debaixo do tapete.


PARA QUE E A QUEM SERVEM OS ATUAIS ESTÁDIOS EM CONSTRUÇÃO?

Romário:
QUE PAÍS É ESSE?
Muito bom!
Parte de entrevista do ROMÁRIO ao jornalista Cosme Rimoli - TV Record ..
- Você foi recebido com preconceito em Brasília?
Olha, vou ser claro para quem ler entender como as coisas são. Há o burro, aquele que não entende o que acontece ao redor. E há o ignorante, que não teve tempo de aprender. Não houve preconceito comigo porque não sou nem uma coisa nem outra. Mesmo tendo a rotina de um grande jogador que fui, nunca deixei de me informar, estudar. Vim de uma família muito humilde. Nasci na favela. Meu pai, que está no céu, e minha mãe ralaram para me dar além de comida, educação. Consciência das coisas... Não só joguei futebol. Frequentei dois anos de faculdade de Educação Física. E dois de moda. Sim, moda. Sempre gostei de roupa, de me vestir bem. Queria entender como as roupas eram feitas. Mas isso é o de menos. O que importa é que esta sede de conhecimento me deu preparo para ser uma pessoa consciente... Preparada para a vida. E insisto em uma tese em Brasília, com os outros deputados. O Brasil só vai deixar de ser um país tão atrasado quando a educação for valorizada. O professor é uma das classes que menos ganha e é a mais importante. O Brasil cria gerações de pessoas ignorantes porque não valoriza a Educação. E seus professores. Não há interesse de que a população brasileira deixe de ser ignorante. Há quem se beneficie disso. As pessoas que comandam o País precisam passar a enxergar isso. A Saúde é importante? Lógico que é. Mas a Educação de um povo é muito mais.
- Essa ignorância ajuda a corrupção? Por exemplo, que legado deixou o Pan do Rio?
Você não tenha dúvidas que a ignorância é parceira da corrupção. Os gastos previstos para o Pan do Rio eram de, no máximo, R$ 400 milhões. Foram gastos R$ 3,5 bilhões. Vou dar um testemunho que nunca dei. Comprei alguns apartamentos na Vila Panamericana do Rio como investimento. A melhor coisa que fiz foi vender esses apartamentos rapidamente. Sabe por quê? A Vila do Pan foi construída em cima de um pântano.. Está afundando. O Velódromo caríssimo está abandonado. Assim como o Complexo Aquático Maria Lenk... É um escândalo! Uma vergonha! Todos fingem não enxergar. Alguém ganhou muito dinheiro com o Panamericano do Rio. A ignorância da população é que deixa essa gente safada sossegada. Sabe que ninguém vai cobrar nada das autoridades. A população não sabe da força que tem. Por isso que defendo os professores. Não temos base cultural nem para entender o que acontece ao nosso lado. E muito menos para perceber a força que temos. Para que gente poderosa vai querer a população consciente? O Pan do Rio custou quatro vezes mais do que este do México. Não deixou legado algum e ninguém abre a boca para reclamar.
- Se o Pan foi assim, a Copa do Mundo no Brasil será uma festa para os corruptos...
Vou te dar um dado assustador. A presidente Dilma havia afirmado quando assumiu que a Copa custaria R$ 42 bilhões. Já está em R$ 72 bilhões. E ninguém sabe onde os gastos vão parar. Ningúem. Com exceção de São Paulo, Rio, Minas, Rio Grande do Sul e olhe lá...Pernambuco... Todas as outras sete arenas não terão o uso constante. E não havia nem a necessidade de serem construídas. Eu vi onze das doze... Estive em onze sedes da Copa e posso afirmar sem medo. Tem muita coisa errada. E de propósito para beneficiar poucas pessoas. Por que o Brasil teve de fazer 12 sedes e não oito como sempre acontecia nos outros países? Basta pensar. Quem se beneficia com tantas arenas construídas que servirão apenas para três jogos da Copa? É revoltante. Não há a mínima coerência na organização da Copa no Brasil.
- São Paulo acaba de ser confirmado como a sede da abertura da Copa. Você concorda?
Como posso concordar? Colocaram lá três tijolinhos em Itaquera e pronto. E a sede da abertura é lá. Quem pode garantir que o estádio ficará pronto a tempo? Não é por ser São Paulo, mas eu não concordaria com essa situação em lugar nenhum do País. Quando as pessoas poderosas querem é assim que funcionam as coisas no Brasil. No Maracanã também vão gastar uma fortuna, mais de um bilhão. E ninguém tem certeza dos gastos. Nem terá. Prometem, falam, garantem mas não há transparência. Minha luta é para que as obras não fiquem atrasadas de propósito. E depois aceleradas com gastos que ninguém controla.
- O que você acha de um estádio de mais de R$ 1 bilhão construído com recursos públicos. E entregue para um clube particular.
Você está falando do estádio do Corinthians, não é? Não vou concordar nunca. Os incentivos públicos para um estádio particular são imorais. Seja de que clube for.. De que cidade for. Não há meio de uma população consciente aceitar. Não deveria haver conversa de politico que convencesse a todos a aceitar. Por isso repito que falta compreensão à população do que está acontecendo no Brasil para a Copa.
- A Fifa vai fazer o que quer com o Brasil?
Infelizmente, tudo indica que sim. Vai lucrar de R$ 3 a R$ 4 bilhões e não vai colocar um tostão no Brasil. É revoltante. Deveria dar apenas 10% para ajudar na Educação. Iria fazer um bem absurdo ao Brasil. Mas cadê coragem de cobrar alguma coisa da Fifa. Ela vai colocar o preço mais baixo dos ingressos da Copa a R$ 240,00.. Só porque estamos brigando pela manutenção da meia entrada. É uma palhaçada! As classes C, D e E não vão ver a Copa no estádio.
O Mundial é para a elite. Não é para o brasileiro comum assistir.
- Ricardo Teixeira tem condições de comandar o processo do Mundial de 2014?
Não tem de saúde. Eu falei há mais de quatro meses que ele não suportaria a pressão. Ser presidente da CBF e do Comitê Organizador Local é demais para qualquer um. Ainda mais com a idade que ele tem. Não deu outra. Caiu no hospital. E ainda diz que vai levar esse processo até o final. Eu acho um absurdo.
- Muito além da saúde de Ricardo Teixeira. Você acha que pelas várias denúncias, investigações da Polícia Federal... Ele tem condições morais de comandar a organização Copa no Brasil?
Não. O Ricardo Teixeira não tem condições morais de organizar a Copa. Não até provar que é inocente. Que não tem cabimento nenhuma das denúncias. Até lá, não tem condições morais de estar no comando de todo o processo. Muito menos do futebol brasileiro...
Entrevista concedida ao repórter Cosme Rímoli, da TV Record.
A África apresentou há alguns meses atrás o resultado final da Copa do Mundo: deu prejuízo e grande. Agora é a vez do Brasil. Fifa, CBF, políticos e os empreiteiros vão ganhar muito dinheiro. E o povo? Nada como sempre!
Apenas terá a obrigação de contribuir para pagar a conta.
Precisamos virar a cara para esses eventos literalmente sujos e mafiosos.
Quem teve a idéia de promover, o evento em nosso país, alguém sabe?
O Brasil é uma farsa, como sempre irá jogar a sujeira para debaixo do tapete.


TRISTE JUDICIÁRIO

Triste Judiciário

Marco Antonio Villa - O Globo - 13 Dez 2011 *

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) é formado por 33 ministros. Foi criado pela Constituição de 1988. Poucos conhecem ou acompanham sua atuação, pois as atenções nacionais estão concentradas no Supremo Tribunal Federal. No site oficial está escrito que é o tribunal da cidadania. Será?

Um simples passeio pelo site permite obter algumas informações preocupantes.

O tribunal tem 160 veículos, dos quais 112 são automóveis e os restantes 48 são vans, furgões e ônibus. É difícil entender as razões de tantos veículos para um simples tribunal. Mais estranho é o número de funcionários. São 2.741 efetivos.

Muitos, é inegável. Mas o número total é maior ainda. Os terceirizados representam 1.018. Desta forma, um simples tribunal tem 3.759 funcionários, com a média aproximada de mais de uma centena de trabalhadores por ministro!! Mesmo assim, em um só contrato, sem licitação, foram destinados quase R$2 milhões para serviço de secretariado.

Não é por falta de recursos que os processos demoram tantos anos para serem julgados. Dinheiro sobra. Em 2010, a dotação orçamentária foi de R$940 milhões. O dinheiro foi mal gasto. Só para comunicação e divulgação institucional foram reservados R$11 milhões, para assistência médica a dotação foi de R$47 milhões e mais 45 milhões de auxílio-alimentação. Os funcionários devem viver com muita sede, pois foram destinados para compra de água mineral R$170 mil. E para reformar uma cozinha foram gastos R$114 mil. Em um acesso digno de Oswaldo Cruz, o STJ consumiu R$225 mil em vacinas. À conservação dos jardins — que, presumo, devem estar muito bem conservados — o tribunal reservou para um simples sistema de irrigação a módica quantia de R$286 mil.

Se o passeio pelos gastos do tribunal é aterrador, muito pior é o cenário quando analisamos a folha de pagamento. O STJ fala em transparência, porém não discrimina o nome dos ministros e funcionários e seus salários. Só é possível saber que um ministro ou um funcionário (sem o respectivo nome) recebeu em certo mês um determinado salário bruto. E só. Mesmo assim, vale muito a pena pesquisar as folhas de pagamento, mesmo que nem todas, deste ano, estejam disponibilizadas. A média salarial é muito alta. Entre centenas de funcionários efetivos é muito difícil encontrar algum que ganhe menos de 5 mil reais.

Mas o que chama principalmente a atenção, além dos salários, são os ganhos eventuais, denominação que o tribunal dá para o abono, indenização e antecipação das férias, a antecipação e a gratificação natalinas, pagamentos retroativos e serviço extraordinário e substituição. Ganhos rendosos. Em março deste ano um ministro recebeu, neste item, 169 mil reais. Infelizmente há outros dois que receberam quase que o triplo: um, R$404 mil; e outro, R$435 mil. Este último, somando o salário e as vantagens pessoais, auferiu quase meio milhão de reais em apenas um mês! Os outros dois foram "menos aquinhoados", um ficou com R$197 mil e o segundo, com 432 mil. A situação foi muito mais grave em setembro. Neste mês, seis ministros receberam salários astronômicos: variando de R$190 mil a R$228 mil.

Os funcionários (assim como os ministros) acrescem ao salário (designado, estranhamente, como "remuneração paradigma") também as "vantagens eventuais", além das vantagens pessoais e outros auxílios (sem esquecer as diárias). Assim, não é incomum um funcionário receber R$21 mil, como foi o caso do assessor-chefe CJ-3, do ministro 19, os R$25,8 mil do assessor-chefe CJ-3 do ministro 22, ou, ainda, em setembro, o assessor chefe CJ-3 do do desembargador 1 recebeu R$39 mil (seria cômico se não fosse trágico: até parece identificação do seriado "Agente 86").

Em meio a estes privilégios, o STJ deu outros péssimos exemplos. Em 2010, um ministro, Paulo Medina, foi acusado de vender sentenças judiciais. Foi condenado pelo CNJ. Imaginou-se que seria preso por ter violado a lei sob a proteção do Estado, o que é ignóbil. Não, nada disso. A pena foi a aposentadoria compulsória. Passou a receber R$25 mil. E que pode ser extensiva à viúva como pensão. Em outubro do mesmo ano, o presidente do STJ, Ari Pargendler, foi denunciado pelo estudante Marco Paulo dos Santos. O estudante, estagiário no STJ, estava numa fila de um caixa eletrônico da agência do Banco do Brasil existente naquele tribunal. Na frente dele estava o presidente do STJ. Pargendler, aos gritos, exigiu que o rapaz ficasse distante dele, quando já estava aguardando, como todos os outros clientes, na fila regulamentar. O presidente daquela Corte avançou em direção ao estudante, arrancou o seu crachá e gritou: "Sou presidente do STJ e você está demitido. Isso aqui acabou para você." E cumpriu a ameaça. O estudante, que dependia do estágio — recebia R$750 —, foi sumariamente demitido.

Certamente o STJ vai argumentar que todos os gastos e privilégios são legais. E devem ser. Mas são imorais, dignos de uma república bufa. Os ministros deveriam ter vergonha de receber 30, 50 ou até 480 mil reais por mês. Na verdade devem achar que é uma intromissão indevida examinar seus gastos. Muitos, inclusive, podem até usar o seu poder legal para coagir os críticos. Triste Judiciário. Depois de tanta luta para o estabelecimento do estado de direito, acabou confundindo independência com a gastança irresponsável de recursos públicos, e autonomia com prepotência. Deixou de lado a razão da sua existência: fazer justiça.

* MARCO ANTONIO VILLA é historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos (SP).

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Codigo Florestal- entrevista com Dieter Warchow

19/4/2011

Código Florestal: 'falta harmonia, conhecimento sistêmico e sobram dispersão e desinformação'. Entrevista especial com Dieter Wartchow

“A natureza que nos assiste, não tem voz para pedir socorro e não fala para mostrar novos caminhos”, constata o engenheiro e pesquisador da UFRGS.

Confira a entrevista.

Para o pesquisador Dieter Wartchow, o novo código florestal deveria ser baseado em fatos, dados e informações resultantes de estudos científicos. “Na abordagem natural usada nas discussões em torno do Novo Código Florestal, falta harmonia, conhecimento sistêmico e sobram dispersão e desinformação. As discussões direcionam-se para os sintomas do problema e são pautadas por ações ou posições fragmentadas, as quais, na maioria dos casos, representam um ponto de vista corporativista, de seu interesse”, apontou ele na entrevista que concedeu à IHU On-Line por e-mail.

Dieter Wartchow é engenheiro graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul com especialização em Hidrologia Aplicada pelo Instituto de Pesquisa Hidráulica. Na UFRGS fez o mestrado em Hidrologia Sanitária. É doutor em Engenharia Sanitária e Ambiental pela Universidade Stuttgart (Alemanha). Atualmente, é professor na UFRGS.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Que outra abordagem é possível para o Código Florestal?

Dieter Wartchow –
Uma abordagem baseada em fatos, dados e informações resultantes do estudo e conhecimento científico. Esta abordagem científica estimularia, a partir da seriedade dos propósitos do Novo Código Florestal, maior participação da sociedade e permitiria um direcionamento do debate para as causas do problema. Na abordagem natural usada nas discussões em torno do Novo Código Florestal, falta harmonia, conhecimento sistêmico e sobram dispersão e desinformação. As discussões direcionam-se para os sintomas do problema e são pautadas por ações ou posições fragmentadas, as quais, na maioria dos casos representam um ponto de vista corporativista, de seu interesse. Criou-se uma grande discussão onde o que parece ser certo para alguns, para outros parece errado. Defende-se e busca-se salvaguardar a destruição já feita e não o que deve ser feito para garantir a sustentabilidade da vida. Neste tabuleiro de xadrez, cada um está a defender o seu quadrado, quando todos são importantes.

IHU On-Line – Em que aspectos o novo código florestal compreende a economia e a ecologia de forma integrada e equilibrada?

Dieter Wartchow –
No Novo Código Florestal falta sinergia entre economia e ecologia. Estudar e cuidar da “casa” pode significar um processo de desenvolvimento econômico mais duradouro e sustentável. Neste, nota-se certo cartesianismo nos percentuais e números propostos, visto que, a natureza tem características singulares de acordo com o bioma e região.

IHU On-Line – Qual é a melhor alternativa para preservar o princípio do ambiente sustentável com desenvolvimento?

Dieter Wartchow –
Vou parafrasear o educador Paulo Freire, no qual “Não há saber maior ou menor, mas sim, saberes diferentes”. Talvez devêssemos discutir e buscar com criatividade novas tecnologias, e não temer uma mudança de comportamento. Plantar de forma diferente, reconhecer a vulnerabilidade da natureza e da biodiversidade e dos riscos de sua irreversibilidade. Também devemos dar à natureza o que é da natureza, por exemplo, adequando nossas atitudes ao tempo que a natureza precisa para renovar o ciclo da água. Permitir o acesso democrático à informação sobre as causas, conseqüências de um pobre manejo florestal. Sermos educandos e educadores. Não sermos indiferentes e participar na construção de um mundo melhor para todos.

IHU On-Line – Você é favorável ao aprimoramento do texto antes da votação? Quais alterações devem ser realizadas?

Dieter Wartchow –
Sim, mas até onde? Por que não se trabalha sobre o antigo, que parece ser melhor do que o novo? A proteção das fontes, das zonas úmidas ao longo dos cursos d’água e das áreas de recarga deve integrar a proposta do Novo Código Florestal. Além disso, segundo a Agência Nacional de Água – ANA, apoiada por estudos internacionais e realizados no Brasil, deve-se compreender o papel das matas e das áreas ciliares na proteção da biodiversidade e da qualidade e quantidade dos nossos mananciais de água e manter faixa de mata ciliar com largura mínima de 30 metros. Não menos do que isto. A assistência técnica e a extensão rural são de vital importância para o assessoramento das atividades rurais nos assentamentos e pequenas propriedades rurais. Desta dependem a manutenção dos habitats para a fauna, a biodiversidade, a prevenção contra erosão e a retenção de água. Quanto às APPs nas encostas íngremes, elas também deveriam ser mantidas e consideradas como serviço ambiental passível de remuneração compensatória.

IHU On-Line – O presidente da Câmara garantiu que o projeto do código somente será encaminhado para votação quando houver acordo sobre a proposta. É possível vislumbrar um acordo entre agricultores e os movimentos sociais contrários as mudanças?

Dieter Wartchow –
Um acordo entre os interlocutores do agronegócio, da agricultura familiar, agricultores, pecuaristas e os movimentos sociais contrários às mudanças propostas no Novo Código Florestal não vai cessar as críticas das partes envolvidas. Um acordo para quais objetivos e metas? Deveríamos observar e dialogar mais com a natureza. A natureza que nos assiste não tem voz para pedir socorro e não fala para mostrar novos caminhos.

IHU On-Line – O presidente da CeCafé, Guilherme Braga, afirma que o Novo Código Florestal pode condenar pequenos sítios e a agricultura familiar. Para a Via Campesina, relacionar agricultura familiar a mudanças no Código Florestal é falácia. Já um estudo feito pela Embrapa mostra que os produtores familiares serão os principais beneficiados. Em um contexto de desinformação, como lidar com constatações tão divergentes?

Dieter Wartchow –
Através da pesquisa do conhecimento científico e do desenvolvimento de atitudes solidárias e sérias para preservar de fato a Floresta Amazônica Brasileira, a Mata Atlântica, os biomas do cerrado, pantanal e pampa. Como todos os atores participantes do debate dizem querer proteger o meio ambiente e as florestas, deveria-se cobrar destes uma declaração de moratória, para evitar a agressão às APPs, às matas e florestas. A discussão sobre o Novo Código Florestal está acontecendo devido ao desrespeito da legislação brasileira e da Constituição Federal, principalmente, do Art. 225, onde fica claro o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o dever do Poder Público e da coletividade de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Melhorar e ampliar a fiscalização contra os crimes ambientais.

IHU On-Line – Considerar as Áreas de Preservação Permanente (APPs) como Reserva Legal evitaria prejuízos para algumas propriedades? Qual seria a melhor proposta para a consolidação de ocupações em APPs?

Dieter Wartchow –
Não sou favorável à consolidação de ocupações em APPs, considerando que a maioria destas áreas oferecem risco às pessoas. Um sistema de informações geográficas, hidrológicas, geológicas, e outras informações relevantes poderia ser um bom instrumento para ao menos estas ocupações serem de conhecimento do poder público. Estes dados e os indicadores deveriam falar a linguagem do povo, para serem bem entendidas e interpretadas. Em sendo inevitável ou em se percebendo que a ocupação não oferece risco às pessoas e/ou relaciona-se com um sistema local de produção (ex.: plantio de uva), poder-se-ia analisar o potencial em transformar quem nelas trabalha em “cuidadores” do ambiente, educando-os e buscando desenvolver e capacitá-los para novas atividades locais de produção.

IHU On-Line – O Novo Código Florestal dá conta de atender a uma produção agrícola com qualidade econômica, ecológica e ambiental dentro dos preceitos atuais da ciência?

Dieter Wartchow –
Sim e não, se forem considerando os milhões de hectares de áreas mal aproveitadas ou ociosas; o uso da terra para produzir com elevada produtividade e também com baixa produtividade, portanto, com potencial para a ampliação da produção agrícola. A qualidade econômica pouco tem a ver com o Novo Código Florestal, pois é o mercado que estabelece os preços das commodities e as condições climáticas que impacta a produtividade para cima ou para baixo. Ecológica e ambientalmente, o Novo Código Florestal pode contribuir para melhorar a qualidade de vida promovendo impactos benéficos sobre a atmosfera (ar), litosfera (solo) e hidrosfera (água), que podem ser considerados reservatórios comunicantes de vida.

IHU On-Line – A proposta do novo código florestal dá conta de um cenário de mudanças climáticas, crise energética e crise alimentar?

Dieter Wartchow –
Quando especialistas discutem sobre o aquecimento global e sua relação com o crescimento dos níveis de carbono equivalente (CO2 equiv.), também estamos falando sobre as mudanças climáticas e seus efeitos sobre a produção de alimentos e sobre a vida em nosso planeta. Este tema, portanto associa ação local e efeito global. Florestas serão muito úteis para absorver gás carbônico e produzir oxigênio. A proposta do Novo Código Florestal poderá contribuir na diminuição dos riscos de geração de energia das hidroelétricas, pois é cientificamente comprovado que florestas e matas ciliares contribuem para a diminuição da erosão e melhora das vazões dos rios. Os sedimentos depositados no fundo das barragens ocupam o espaço que deveria ser destinado para armazenamento de água, além de poderem ser precursores da proliferação de algas tóxicas. A previsão de se poder usar parte da Reserva Legal para o plantio de árvores exóticas potencializa a queima da madeira para diversas atividades econômicas. O modelo de exportar água virtual e de usar madeira da floresta amazônica e do cerrado brasileiro como fonte de energia para a indústria do aço precisa ser reavaliado. A crise alimentar relaciona a falta de acesso aos alimentos pela população pobre, e não especificamente uma crise de produção de alimentos.

IHU On-Line – O novo código está sendo avaliado pelo que induz em termos de dinâmica social e cultural no país?

Dieter Wartchow –
Não acredito que a dinâmica social e cultural do país tenha importância preponderante na discussão em torno do Novo Código Florestal. Geralmente, é a ordem econômica que domina as ações políticas e determina quais concessões podem ser feitas ao povo e ao meio ambiente. Transformar um problema em uma oportunidade requer informações cientificamente analisadas em vez de informações desencontradas. Devemos procurar não acomodar situações e com conhecimento, habilidade e atitude, devemos também buscar equacionar este tema, que lida com nossa vida. Salvemos um grande potencial de futuro do Brasil, nossas florestas e nossa água.

Código Florestal

29/11/2011
Em vez de código florestal, Brasil terá código agrícola
No polarizado debate entre ambientalistas e ruralistas sobre as mudanças propostas no Código Florestal, o empresário Roberto Klabin é uma das raras personalidades com trânsito e atuação nas duas esferas, seja como presidente da Fundação SOS Mata Atlântica, ONG ambientalista que atua na preservação das florestas, seja como pecuarista e empresário do setor de papel e celulose (é um dos principais acionistas da Klabin).

A entrevista é de André Palhano e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 29-11-2011.

Eis a entrevista.

De onde surgiu a ideia de alterar o Código Florestal?

A movimentação toda aconteceu a partir de 2008, quando o presidente Lula começou a utilizar a lei de crimes ambientais para enquadrar produtores que não estavam adequados. Isso gerou uma tensão grande no setor e criou-se uma comissão, chefiada pelo Aldo [Rebelo], para alterar a legislação.

O problema é que nunca houve ali a intenção de melhorar o código anterior ou tornar o Brasil mais moderno na questão ambiental, mas sim favorecer apenas um setor da sociedade, que é o do agronegócio, em detrimento de outros setores e até da população. O que temos na proposta é um código agrícola, não um código florestal.

O que explica tamanha polarização no debate?

O fato de terem chamado apenas um setor para discutir mudanças que dizem respeito a todos. Isso é que gerou toda essa mobilização da sociedade. Obviamente, não podemos criticar o processo, que foi democrático.

O problema é que, além da assimetria dos poderes envolvidos, o resultado é um retrocesso que afetará negativamente a todos no futuro, inclusive o produtor rural.

De que maneira?

Um exemplo: vários países estão começando a entender a necessidade de mitigar e adaptar os efeitos das mudanças climáticas, enquanto o Brasil está indo na contramão da história, uma vez que as mudanças no código claramente pioram esses efeitos. E não sou eu quem está afirmando isso, é a ciência.

Em resumo, para atender interesses de curto prazo de um grupo específico da sociedade, estamos retrocedendo em temas que afetarão negativamente a todos.

Quem defende a mudança no código alega que a legislação atual impede o aumento da produção no campo, prejudicando a economia. Como o sr. vê essa questão?

É um falso dilema. Um estudo da Esalq-USP, por exemplo, mostrou que há mais de 100 milhões de hectares de vegetação que se encontram fora de áreas de proteção e que poderiam ser desmatados, dos quais 26 milhões propícios à agricultura. Hoje, temos toda a agricultura do país localizada em 60 milhões de hectares. A alegação de que é impossível se adequar também não é correta.

Se a lei caminhar em sentido contrário, quem se adaptou não acaba sendo prejudicado?

De forma nenhuma. Tanto por essa tendência dos consumidores e da regulação como pela proteção que eles acabam tendo em um cenário de mudanças climáticas e aproveitamento do valor econômico da biodiversidade. Isso sem falar na proteção natural contra pragas, incêndios e outros temas. Ou seja, quem não se adaptar agora resolverá um problema econômico de curto prazo, mas terá de enfrentar isso lá na frente, provavelmente com impacto negativo maior.

O que o sr. está dizendo é que o setor agrícola sofrerá um efeito bumerangue no futuro?

O produtor brasileiro terá de se adequar para atender às exigências de mercado que vêm por aí, isso é inevitável. Fica cada vez mais claro que teremos de trabalhar em cadeias de certificação, e quem mais vai se prejudicar nesse processo, mantida a tendência atual, é o pequeno produtor, que tem mais dificuldades de adaptação quando comparado aos grandes. Isso não está sendo considerado.

Passada a votação, o embate entre ambientalistas e ruralistas deixará cicatrizes?

Sem dúvida ficarão mágoas, sem dúvida o Brasil perde com essa polarização, mas isso não é muito diferente de outros países. O entendimento da sociedade sobre as questões de sustentabilidade ainda é fraco, tratado de maneira secundária.

De qualquer forma, tudo isso deixará uma grande lição para os ambientalistas, que é trabalhar melhor e com maior representatividade em Brasília. Tenho certeza de que muitos deputados que votaram a favor das mudanças no código nem imaginavam o que estavam aprovando, só seguiram suas lideranças. Temos de reforçar esse trabalho de conscientização.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

RECOLONIZAÇÃO descarada dos paises islâmicos

1/9/2011
A Líbia, a Otan e o Grande Médio Oriente
O que ocorrerá na Líbia após a guerra? Haverá um longo período de caos, seguido da formação de um governo de coalizão tribal, instável e autoritário, sob o patrocínio e a tutela militar da Otan. Assim, estará criado o primeiro “protetorado colonial” da organização militar, na África.

A opinião é de José Luís Fiori, cientista político, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em artigo publicado por Carta Maior, 31-08-2011.

Eis o artigo.

Se aqui e no exterior todos perceberem que estamos prontos para a guerra a qualquer momento,
com todas as unidades das nossas forças na linha de frente prontas para entrar em combate
e ferir o inimigo no ventre,
pisoteando-o quando estiver no chão,
para ferver seus prisioneiros em azeite e torturar suas mulheres e filhos,
então ninguém se atreverá no nosso caminho”.

John Arbuthnot Fisher,
Primeiro Lord do Almirantado da Marinha Real Britânica,
(cit. in Norman Angell, A Grande Ilusão, Editora UNB, 2002, p: 275)


É preciso ser muito ingênuo ou mal informado para seguir pensando que a “Guerra da Líbia” foi feita em nome dos “direitos humanos” e da “democracia”. E, ainda por cima, acreditar que o governo de Muamar Kadafi foi derrotado pelos “rebeldes” que aparecem nos jornais, em poses publicitárias. Tudo isso, enquanto a aviação inglesa comanda o ataque final das forças da Otan à cidade de Sirta, depois de ter conquistado a cidade de Trípoli. Até o momento, a "primavera árabe" não produziu nenhuma mudança de regime na região, mesmo na Tunísia e no Egito, e não há nenhuma garantia de que os novos governos sejam mais democráticos, liberais ou humanitários que seus antecessores.

Até porque quase todos os seus líderes ocuparam posições de destaque nos governos que ajudaram a derrubar, com o apoio de uma multidão heterogênea e desorganizada. No caso da Líbia, não se pode nem mesmo falar de algo parecido a uma "mobilização massiva e democrática" da oposição, porque se trata de fato de uma guerra selvagem e sem quartel, entre regiões e tribos inimigas, que foram mobilizadas e "pacificadas" transitoriamente, pelas forças militares da Otan.

Segundo Lord Ismay, que foi o primeiro secretário-geral da Otan, o objetivo da aliança militar criada pelo Tratado do Atlântico Norte, assinado em 1949, era "manter os russos fora, os americanos dentro e os alemães para baixo". E este objetivo foi cumprido plenamente, durante todo o período da Guerra Fria. Mas depois de 1991 a Otan passou por um período de "crise de identidade" e redefinição do seu papel dentro sistema internacional.

Num primeiro momento, a organização militar se voltou para o Leste e para a ocupação/incorporação de alguns países da Europa Central que haviam pertencido ao Pacto de Varsóvia. Além disso, decidiu participar diretamente das Guerras do Kosovo e da Sérvia. E, ao mesmo tempo, lançou, em 1994, um projeto de intercâmbio militar e de segurança com os países árabes do norte da África, o chamado “Diálogo Mediterrâneo”.

Dez anos depois, na sua reunião de cúpula de 2004, em Istambul, os dirigentes da Otan decidiram expandir o seu projeto de segurança e criaram a "Iniciativa de Cooperação de Istambul" (ICI), voltada para os países do Oriente Médio. Além disso, neste mesmo período, a Otan, que não havia apoiado as guerras do Afeganistão e do Iraque, decidiu aderir e colocar-se ao lado das tropas anglo-americanas, instalando suas forças também na Ásia Central.

Foram os ingleses que cunharam o termo "Oriente Médio", para referir-se aos territórios situados no meio do seu caminho, entre a Inglaterra e a Índia, e que pertenciam ou estavam sob a tutela do Império Otomano. Incluindo os territórios que foram retalhados e divididos depois do fim da Primeira Guerra Mundial, sendo transformados em “protetorados” da Inglaterra e da França - que já eram, naquele momento, as duas maiores potências imperiais da Europa e que submeteram e colonizaram a maior parte da África Sub-Sahariana e todos os países árabes do norte do continente, hoje incluídos no “Diálogo Mediterrâneo” da Otan.

Mas foi o ex-presidente norte-americano George W. Bush quem cunhou o termo “Grande Médio Oriente”, apresentado pela primeira vez na reunião do G-8, realizada em Sea Islands, nos EUA, em junho de 2004. A idéia era definir e unificar um novo espaço de intervenção geopolítica, que iria do Marrocos até o Paquistão, e deveria ser objeto da preocupação prioritária das Grandes Potências na sua guerra contra o “terrorismo islâmico” e a favor da “democracia” e dos “direitos humanos”. Desta perspectiva, se pode compreender melhor o significado geo-estratégico da “primavera árabe” e da Guerra da Líbia.

Assim mesmo, o que se deve esperar que ocorra depois da guerra? Na Líbia, haverá um longo período de caos, seguido da formação de um governo de coalizão tribal, instável e autoritário, sob o patrocínio e a tutela militar da Otan. Ao mesmo tempo, estará dado um passo decisivo na construção de uma força de intervenção “ocidental”, capaz de projetar seu poder militar sobre todo o território islâmico do Grande Médio Oriente. E, de passagem, estará criado o primeiro “protetorado colonial” da Otan, na África. Triste sina da África!

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

CHINA atual.

Na verdade, a China pode ser considerada a Potencia mais avançada da atualidade.. Exemplo de seriedade com as coisas públicas. Lá os corruptos e corruptores são punidos conforme as leis do país, ao contrário do que acontece no mundo ocidental onde os Palocis, Nascimentos, Malufes, etc.etc.etc. continuam lampeiros e felizes da vida. Ainda temos idiotas trotkistas e reacionários reclamando da falta de Direitos Humanos por lá. É de provocar risos.

Ladislau Dowbor vê a China
By
admin
– 01/08/2011Posted in: Capa
Buzz

Imagens e breves impressões sobre país cada vez mais poderoso e influente — e que precisamos compreender, mais que julgar
Texto e fotos de Ladislau Dowbor*
A tradição ocidental é de qualquer pessoa que passa um par de semanas na China escrever um livro. Não pretendo ir aqui além de algumas imagens. A realidade é que a China apresenta uma dinâmica absolutamente impressionante de crescimento econômico, transformações em ritmo que temos dificuldades em conceber. Crescer 10% ao ano significa a economia dobrar de tamanho a cada 7 anos. Isto quando um em cada 6 habitantes do planeta é chinês. Não se trata de assunto de chinês, trata-se de todos nós.
No par de semanas em que estive na China, visitei Beijing, Chengdu (1600 km para o interior), e Shanghai, realizando conferências em cerca de 10 instituições universitárias, organizações da sociedade civil, e até na escola de formação de quadros do Partido Comunista. Todos interessados em sistemas de gestão descentralizada e inovações institucionais da América Latina. E eu interessado, como é natural, em como funciona a própria China.
Todos sabemos que a dinâmica é poderosa, que se trata da segunda economia do mundo, e no entanto não sabemos como e porque funciona. Segundo as nossas opções ideológicas, achamos que é um exemplo, ou que é um desastre ambiental, ou ainda um desastre social. Outros ainda declaram que é uma ditadura e fazem de conta que é tão simples assim. As simplificações, como sempre, sobrevivem porque simplesmente sabemos muito pouco. Na realidade vi muita coisa interessante em todas as dimensões. E cabe não esquecer que a China tirou 430 milhões de pessoas da miséria entre 1981 e 2000 (ONU, The Inequality Predicament, p. 78), cifra que ultrapassa 500 milhões segundo Lester Brown (Brown, 2011).
Arrisco apenas uma ideia geral, que discuti em vários meios e consultei em vários documentos, e que parece razoavelmente segura: o sistema é politicamente centralizado, no sentido de traçar as orientações gerais. No entanto, a execução, e de forma geral a gestão da economia, do meio ambiente e das políticas sociais estão radicalmente descentralizadas, permitindo uma enorme flexibilidade e pragmatismo nas soluções. E não se trata apenas de descentralizar os encargos, pois os próprios recursos são descentralizados, através de caótico, mas funcional sistema de orçamento central articulado com recursos para-orçamentários locais. (Catherine Wong).
No mais, através de fotos tiradas nesta viagem em junho 2011, trago algumas impressões do cotidiano: antes de tudo, com a imensa pressão populacional e pouca terra fértil, as grandes cidades optaram claramente pela verticalização. Nada dos subúrbios típicos das grandes cidades norte-americanas. A China urbana cresce para cima.












Shanghai, novo bairro residencial (junho 2011)
As universidades não escapam a esta lógica, como se vê na foto seguinte. As duas imensas torres geminadas são uma faculdade de administração em Beijing.

Beijing, Faculdade de administração, (junho 2011)
Abaixo, típica avenida de Shanghai, bairro residencial novo. O pouco trânsito deve-se a que os meus passeios em horário livre eram muito cedo. Mas a estrutura intermodal de trânsito é típica: duas ou três faixas para automóveis, separação com plantas definindo claramente o espaço onde andam bicicletas e pequenas scooters, todos elétricos, e uma calçada arborizada bastante ampla. O planejamento permite que o espaço não seja (inteiramente) comido por interesses imobiliários, equilibrando o uso do espaço viário, no que hoje se chama de “ruas completas”, e não apenas para carros.

A mobilidade, naturalmente, e um problema central, com cidades ultrapassando 20 milhões de habitantes. Na foto abaixo, de Shanghai, vemos a integração do sistema. À direita na foto, a boca de metrô, são 420 quilómetros na cidade, fora as conexões ferroviárias para o interior. A densidade de metrô muda evidentemente todos os parâmetros, pois a grande massa de deslocamentos no triângulo casa-trabalho-escola no mesmo horário todo dia é enxugada, liberando a superfície. É bom lembrar que em São Paulo temos 65 quilômetros, e uma média ridícula de 650 metros por ano nos últimos 16 anos de governo xuxu. Vemos também a faixa exclusiva para bicicletas e motinhos (quase sempre elétricas), à esquerda na foto faixas para carros, à direita amplo espaço de calçada, e sempre que possível todas as separações com plantas e árvores. A sinalização é clara, conforme se vê na foto seguinte.















Uma opção importante que apareceu de forma massiva nas três cidades que visitei, Beijing, Chengdu e Shanghai, é a presença generalizada da bicicleta e da scooter (bem parecido com as nossas “Biz”) elétricas: silenciosas e sem poluição, com uma autonomia entre 50 e 60 quilômetros. No caso das bicicletas, as pessoas ajudam com pedal em caso de subida forte ou rampa. Não exigem complicações de registro de veículos nem capacete.


Os preços são ridículos (entre 800 e 1500 yuan, cerca de 250 a 350 reais). O preço não se deve apenas a baixos salários: é um motor elétrico e uma bateria, o resto é lataria e borracha. Não precisa de tanque de combustível, sistema de distribuição, carburador, pistões, embreagem etc. A não entrada desta tecnologia simples no Brasil para mim é um mistério que só a teoria dos cartéis resolve. A manutenção é igualmente ridícula. A recarga se dá em geral à noite, quando há um superávit de energia. Adeus petróleo: mas se a energia é limpa no uso, na produção ainda é muito carvão. O Brasil teria muitas vantagens neste plano.
A China sofreu recentemente violentas inundações, resultado em parte de fenômenos naturais mais violentos gerados pelo aquecimento global, mas sobretudo pelo desmatamento irresponsável. Em decisão típica da China, de definir rumos a partir do governo central e deixando cada cidade do país aplicar as normas segundo as suas realidades, foram plantadas árvores aos bilhões (ver em particular dados em Lester Brown, World on the Edge). Por toda parte se vêm estas árvores reforçadas por estacas, indicando plantio recente. Encontrei este esforço por onde passei. As cidades estão se tornando verdes.


Shanghai, Centro de Formação de Quadros, (junho 2011)
Outra foto típica:


Ampla calçada com árvores (sempre sustentadas, demonstrando plantio recente), que segue o rio da cidade em Chengdu, que fica à direita da foto, bem diferente por exemplo da beira do Tietê em São Paulo. As próprias calçadas são quando possível em parte feitas com bloquetos furados, o que permite manter a permeabilidade do solo.

A limpeza das cidades é absolutamente impressionante, não se encontra sequer bitucas nas calçadas. Já tinha notado isto em visita anterior anos atrás, até em feira de rua no interior não havia um pedaço de lixo no chão. As lixeiras que sem complicações separam apenas o reciclável e não reciclável, se encontram em grande quantidade, e o que é mais importante, estão limpas e renovadas, o que significa um sistema permanente de manutenção. Claramente, não se trata aqui apenas de infraestrutura e de serviços, mas também de uma cultura da limpeza.


Nos bairros mais tradicionais, uma densa movimentação de mercadinhos, feiras, pequeno comércio de rua, ainda pouco destruído por shoppings. O chinês vive muito na rua nestes bairros. Nos mercadinhos, inúmeros tipos de macarrão, muitíssima verdura, e colado pequenos negócios que vendem scooters elétricas, literalmente a preço de feira.





A riqueza de verduras é impressionante. Extremamente saborosas, e aparecem em grande quantidade em todas as refeições. Aliás, pouquíssima gente gorda, que dirá obesa. A agricultura urbana é muito presente, não se desperdiça um metro que possa ser plantado. Na foto abaixo, parece que estamos no campo, com edifícios presentes por engano, mas a foto foi tirada de uma avenida movimentada.

Na mesma rua, em Shanghai, um típico quiosque de jornais: inúmeros diários, nenhuma publicação do tipo que curiosamente chamamos de “masculina” no Brasil.


No interior da região de Chengdu, uma paisagem bastante típica de cinturões verdes de metrópoles: cultivos extremamente densos, próximos da jardinagem, asseguram uma produtividade muito elevada, típica de pequena propriedade (na realidade direito de uso, na China). A variedade grande de plantios reduz problemas de doenças e melhora a conservação do solo. As fotos mostram policultura de legumes e plantação de uva. Na foto com carro, vemos que aproveitam a terra até a um palmo da estrada. Aqui a idéia de que agricultura moderna e produtiva só seria em grande escala, tão difundida no Brasil pelos ruralistas, simplesmente não faz sentido. Não se esbanja terra. Aliás, os que defendem a liberação de desmatamento em “pequenas propriedades” no Brasil, estão se referindo a quatro módulos, 400 hectares nas regiões mais ameaçadas, dois por dois quilômetros! Só no Brasil para chamar isto de pequena propriedade….Mas voltemos à China.




A foto abaixo apresenta o centro de Shanghai, mistura de prédios ultramodernos com calçadas tranquilas. A linha horizontal no meio da foto é uma calçada elevada que dá a volta em toda a praça, permitindo caminhadas sem stress, e uma bela vista. É muito frequentada.







A beira do rio de Shanghai é aberta, permitindo passeio, apesar do dia de chuva em que visitamos. Na foto seguinte, vemos o lado tradicional da cidade, com arquitetura ainda dos ingleses.


E em seguida o centro moderno do outro lado do rio, com a sua imensa torre de TV. Este horizonte é o cartão de visita da cidade.


Espaços de lazer urbano existem, de forma desigual. Amplas áreas claramente de arborização recente (sempre os suportes para árvores transplantadas). Em torno de monumentos tradicionais, muito água, peixes. Na foto abaixo vemos um parque, o córrego que corre para o rio (no centro da foto, a área verde-claro) não aparece, pois é densamente coberto pelas plantas que filtram a água e a deixam limpa antes que caia no rio pouco adiante. Nas partes abertas, o cuidado com as flores.




Chengdu, parque no centro, (junho 2011)
A foto a seguir veio totalmente por engano, momento de distração, mas estou incluindo por razões estéticas, e sobretudo porque me encheram de avisos dizendo que na China é tudo plano, por assim dizer. Maldade desta gente.

Moral da história? Com este pequeno relato fotográfico, à margem de uma correria de palestras, pretendi apenas dar imagens, e sobretudo evitar as simplificações ideológicas com as quais frequentemente nos contentamos sobre a China. Aliás, esta em geral não dá muita bola para os nossos julgamentos, pois é imensa e busca os seus equilíbrios internos. No conjunto das discussões, vi muito pragmatismo. E muita preocupação com o ritmo de penetração de um modo de vida ocidental pouco sustentável para o país. Sobre este ponto, aliás, há uma excelente leitura recente, de Chandran Nair, Consumptionomics: Asia’s role in reshaping capitalism and saving the planet. O importante hoje, mais do que julgar a China, é entendê-la.
Impressão geral? Convivem em complexa articulação o ultramoderno em vertiginosa expansão, os bairros tradicionais de classe média intocados mas com intervenção de serviços urbanos, os antigos bairros paupérrimos que estão sendo simplesmente desmantelados e substituídos por prédios, e o imenso interior cada vez mais articulado pelas cidades regionais. Vários séculos se reordenam na dinâmica da modernização. E todo mundo estuda.
Mais sobre a China e seus papéis:
Lester Brown – The World on the Edge – www.earth-policy.org , 2011
Chandran Nair – Consumptionomics – John Wiley & Sons, Singapore 2011
UN – The inequality predicament – New York 2005
Christine Wong and Vivienne Shue – Paying for Progress in China, Routledge, 200

Ladislau Dowbor formou-se em Economia Política pela Universidade de Lausanne (Suíça) e é doutor em Ciências Econômicas pela Escola Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia (Polônia). Atualmente, é professor titular de pós-graduação na PUC-São Paulo. Presta consultoria a diversas agências das Nações Unidas, bem como ao Senac. Atua como conselheiro na Fundação Abrinq, Instituto Pólis e outras instituições. Mantém e atualiza com frequência um site instalado em www.dowbor.org